Em perigo de extinção, as araras-azuis-de-lear, aves que vivem unicamente no sertão baiano, acordaram mais esperançosas na manhã desta sexta-feira (14/abril). É que a Justiça julgou procedente uma ação movida pelo Ministério Público (MP) e determinou a suspensão imediata de três licenças concedidas pelo Inema (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos) para funcionamento do Complexo Eólico Canudos – Parque Eólico Canudos I e II, até que seja elaborado um estudo e relatório de impacto ambiental e audiência pública.
Na ação, o MP informou que o Inema não observou um ponto importante em uma resolução do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente), que estabelece os parâmetros para licenciamento ambiental de empreendimentos de geração de energia eólica. O documento prevê que não poderá ser considerado empreendimento eólico de baixo impacto ambiental aqueles que estejam localizados em áreas de ocorrência de espécies ameaçadas de extinção, como é o caso da arara-azul-de-lear, além de englobar na restrição áreas de endemismo restrito para qualquer espécie e rotas de aves migratórias.
De responsabilidade das empresas Voltalia e Eólica Canudos, a forma como o parque eólico foi instalado no município de Canudos serviu de motivação para dois inquéritos civis. Dentre eles, um foi instaurado em 2019 pela Promotoria Regional Ambiental de Euclides da Cunha e traz à tona a preocupação das comunidades de que o parque “traria impactos aos moradores da região, com uma considerável supressão de vegetação nativa, podendo trazer implicações sobre a fauna local, principalmente na criação de animais”. O segundo inquérito foi instaurado na Procuradoria da República no Município de Feira de Santana e denuncia que o empreendimento foi implantado “em local composto por ecossistemas integrantes do bioma caatinga, com risco de provocar impactos negativos ao meio ambiente, sobretudo à arara-azul-de-lear, ameaçada de extinção, bem como a outras espécies vegetais e animais com endemismo restrito para a caatinga”.
Nos dois processos, o MP menciona que o Inema classificou o Complexo Eólico de Canudos como de médio porte e de pequeno potencial poluidor (classe 03), “desprezando que a área de implantação do empreendimento se insere na região onde há ocorrência de espécies ameaçadas de extinção e área de endemismo restrito da espécie arara-azul-de-lear”. O MP alertou, ainda, que durante o processo de licenciamento, o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) alertou que não houve a observância de outro ponto importante na resolução do CONAMA e “recomendou que se procedesse a reclassificação do processo de licenciamento para a classe 6, com exigência da apresentação do Estudo de Impacto Ambiental, Relatório de Impacto Ambiental e audiência pública”. Segundo aponta o documento, nenhuma das exigências foram cumpridas pela Voltalia nem pelo Inema.
À época, tanto a Voltalia quanto o Inema se manifestaram pelo não atendimento da recomendação elaborada pelo Ministério Público e nenhuma das exigências legais foram cumpridas. A empresa alegou, inclusive, “que não encontraram, nas recomendações, elementos técnicos suficientes para ensejar uma mudança de postura da empresa, considerando ainda que a suspensão do licenciamento e das obras não traria nenhum benefício ao meio ambiente”, aponta o MP.
Em nota ao site Retratos e Fatos, o Projeto Jardins da Arara de Lear, que atua na preservação da espécie, disse que espera que com a liminar sejam feitos os estudos necessários para identificar os riscos ao meio ambiente, especialmente às araras. “São animais que voam em bandos e a região do empreendimento está, exatamente, no centro das principais rotas entre seus dormitórios. Além da flora e fauna, é importante que esses grandes empreendimentos respeitem o modo de vida das comunidades tradicionais, e a rica cultura local não pode ser ignorada”.
Na decisão, a Justiça afirma que, ainda que houvesse dúvida sobre a existência da arara-azul-de-lear na região de abrangência do parque eólico, fazia-se necessário a realização de um estudo de impacto ambiental, como forma de precaução e cautela contra riscos ambientais.
A decisão da Justiça é para cumprimento imediato, sob pena de multa diária de R$ 300 mil. Retratos e Fatos entrou em contato com a Voltalia através da assessoria de comunicação, mas até a publicação dessa reportagem, nenhuma declaração foi enviada.
Nota encaminhada pela Voltalia às 18h32
Até o momento a Voltalia não foi notificada sobre a proposição da ação civil pública proposta pelos Ministério Público Federal e Estadual. Os Parques Eólicos Canudos I e II são objeto de processo de licenciamento ambiental conduzido pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – INEMA/BA, que, após avaliar os estudos e projetos apresentados pelo empreendedor, concedeu todas as licenças ambientais necessárias para a sua implantação e operação.
As possíveis consequências ambientais e sociais da implementação de tais projetos foram exaustivamente estudadas, tendo sido previstas as medidas necessárias para evitar e mitigar potenciais impactos negativos, assegurando a viabilidade ambiental dos empreendimentos, conforme reconhecido pelo órgão ambiental competente.
A Voltalia reforça seu respeito e compromisso com o meio ambiente, com o desenvolvimento das regiões onde atua e com toda a sociedade demonstrados durante toda sua trajetória de mais de 15 anos de atuação no Brasil, e seguirá aberta ao diálogo para eventuais questionamentos das autoridades, comunidades, ambientalistas e sociedade civil, colocando-se inteiramente à disposição.
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