Cátia Souza: “We are Carnaval, We are folia”. Entre o sagrado e o profano, somos carnaval!

No Brasil o carnaval é um período de descontração e liberdade, depois dele o ano verdadeiramente começa.
"Enveredar entre o santo e o profano nos possibilita termos o privilégio da escolha de nossas crenças". Foto: Cleber Sandes/Coofiav/Folhapress

O carnaval como uma das festas mais conhecidas de nosso país nos remete a pensar sobre seus aspectos culturais, sua formação e sobre suas tendências humanas religiosas ao longo da história. Ele é considerado um festejo profano, possui características peculiares e assim como o sincretismo beatificado, nos põe a analisar como somos influenciados e o quanto o nosso país é rico na diversidade que forma a coletividade. Entre o entrudo e o sincretismo, presenciamos a vivência carnavalesca em muitos cantos do nosso país e a Bahia é um desses lugares que consagra essa festa e torna a vida baiana mais singular.

O escritor Reginaldo Prandi, especialista em sociologia das religiões, afirma que no Brasil o sincretismo teve início em meados do século XIX. Ele diz que o fato ocorreu quando os escravos deixaram as senzalas e seus confinamentos e passaram a ocupar os espaços da cidade. Quando confinados, recebiam influência do catolicismo e muitos não podiam manifestar suas religiões africanas, logo, libertos, passaram a reconstruí-las. Assim temos um panorama breve da fusão das religiões e o que vemos na atualidade, onde o sincretismo prolifera em terreno fértil, é o fortalecimento entre as religiões de maneira que elas podem ser vividas “sem restrições” e trazem conforto e esperança para muitas pessoas.

Em meio a esse fato, a Bahia como território predominantemente composto de afro descentes se apresenta como um Estado riquíssimo nessa fusão e nos expede a pensar até onde nos envolvemos entre o que não é sagrado e nos dá prazer e liberdade e o que é de fato religioso, ao ponto de nos tolher inclusive as nossas mais singularidades humanas. Aqui cito a festa de Iemanjá. A mãe das águas, a rainha do mar, a divindade feminina que aparece e é muito lembrada durante o mês de fevereiro, esse ano sendo o mês do carnaval, apresenta o tema na capital baiana “Odoyá, 100 anos de Festa e Reverência a Iemanjá”, coloca em evidência a figura dela como a simbologia do criativo humano.

Sabemos que Iemanjá é conhecida por muitos nomes. Na mitologia grega, segundo o escritor Adenáuer Novaes, ela aparece como Deméter, Afrodite e Atená e não é novidade que ela também surge como contraponto a hegemonia do masculino. De tal modo, quando falamos de sincretismo, não podemos deixar de citá-la, não somente como um dos maiores símbolos do assunto, mas como do poder que a figura da mãe das águas representa na vida de muitos humanos, em especial dos soteropolitanos.

Enveredar entre o santo e o profano, conhecedores que somos das diversidades religiosas que temos no Brasil, nos possibilita termos o privilégio da escolha de nossas crenças. O que no século XIX foi arrebatado de forma cruel aos que aqui foram escravizados, hoje é vivido em partes de forma libertária e apesar disso, torna a fusão entre as religiões algo para enriquecer os aspectos culturais, assim como prova que somos um só quando o assunto é a alegria carnavalesca.

No Brasil o carnaval é um período de descontração e liberdade, depois dele o ano verdadeiramente começa. É válido cultuar e respeitar as fragilidades humanas no sentido do endeusamento e enaltecimento da figura não só de Iemanjá, mas de muitos orixás e santos. O que não vale é perdermos a racionalidade que devemos ter quando os invocamos, pois por vezes isso demonstra o quanto ainda estamos em busca de uma saída para questões pessoais e que caracterizam a falta do autoconhecimento.

O mais importante é que além da diversão possamos promover mudanças na própria vida, como diz Novaes “em meio a liberações contraditórias”, que jamais a gente se esqueça do respeito às adversidades culturais e religiosas e sobretudo que haja o combate as discriminações de qualquer natureza no seio da nossa sociedade. Afinal não só a Bahia, mas boa parte dos brasileiros não deixará de viver o carnaval com regozijo. E você, como vive o carnaval?

Cátia Souza é assistente social, especialista em Gestão de Saúde Pública, MBA em Políticas Públicas Municipais, especialista em Educação – Gestão de Tutoria/EAD e especialista em Gestão Organizacional de Pessoas.

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