Se queres ser universal, cante sua aldeia.
Leon Tolstoi
Recebi, há poucos dias, um convite para uma entrevista. A interlocutora me disse que precisava realizar um trabalho, a pedido de um professor, com um escritor pombalense. Mesmo estando nesta cidade, fui rápido na resposta: não sou de Ribeira do Pombal, mas do Sertão dos Tocós, perífrase que faz alusão à cidade banhada por águas termais e agraciada por uma natureza que edulcora nossas paisagens. Tucano é o ambiente onde nasci e tenho orgulho de pertencer. Hoje, nele não resido, mas este lugar habita em mim, integrando minha identidade.
A cidade comemorará 185 anos de emancipação política neste 21 de março, em um momento de forte efervescência cultural. Tucano é referência na quantidade numerosa de cidadãos engajados com a educação e o fomento à cultura em seus mais diversos ramos.
Completar mais de 18 décadas nos convida a refletir sobre nossa história, política e acerca dos contextos em que vivemos. Em 2022, embora também tenhamos inúmeros desafios pela frente, há muito o que comemorar: a cidade vive em efervescência cultural, com um departamento mais atuante, preocupado em garimpar nossas belezas naturais, artísticas e simbólicas que foram solapadas pela política do atraso que não vê nesses elementos um liame necessário ao desenvolvimento do município.
Tucano ganhou, há pouco tempo, mais uma professora doutora, oriunda da escola pública e que milita por uma cultura e educação crítico-emancipatória, além de ter participado da trajetória formativa da maioria dos(as) professores(as) que atuam na Rede Municipal de Ensino. Maria José Firmino, carinhosamente conhecida por Firmino orgulhou a comunidade tucanense com a defesa de sua tese intitulada “Experiências curriculantes e coautoria de si: compreensões poéticas dos discursos de estudantes do Ensino Médio de uma escola pública estadual de Tucano/BA”. Seu trabalho de conclusão de curso tomava como campo empírico de pesquisa a nossa cidade e, na banca, havia, além de insignes integrantes, outro tucanense com ampla trajetória na educação universitária, o Prof. Dr. José Jackson Reis dos Santos, autor de diversos livros e vinculado ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), no qual contribui com pesquisas acadêmicas assentadas, principalmente, na investigação (meta)crítica da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Por outro lado, a Prof. Ma. Janice Cerqueira anunciou que seu trabalho defendido junto ao Programa de Pós-graduação em Estudos Literários da UEFS recebeu o Prêmio Malê de Literatura. Nesse sentido, a dissertação intitulada “Da literatura afro-brasileira à poesia afro-feminina de Conceição Evaristo” será publicada em formato de livro por uma editora cujo projeto está voltado à disseminação de obras que divulgam, respeitam e problematizam as relações étnico-raciais no Brasil, país ainda fortemente marcado pelo patriarcado, pelo patrimonialismo e pelo racismo estrutural.
As publicações não param por aí. De formar complementar à historiografia articulada por Rubens Rocha, autor de História da Câmara, História do Integralismo, Vultos populares e Caminhos de Lampião, o professor e historiador André Carvalho divulgou, em suas redes sociais, que sua dissertação intitulada “A caravana integralista em Tucano: poder local e Integralismo no sertão baiano (1930-1949)” será transformada em livro e publicada pela editora Dialética.
O professor e também poeta Roberto Santos Queiroz, mestre em estudos literários pela UEFS, anunciou que publicará seu terceiro livro, Enquanto nos devoramos, depois de ter nos presenteado com A paisagem cinza dilacerada e O inverso do sopro.
Há pouco tempo, publiquei BNCC: que axé ela tem?, uma obra com reflexões críticas em torno da Base Nacional Comum Curricular e de suas ramificações. Ademais, lançarei, na Bienal do Livro de São Paulo, em julho, Eu não posso ler seu livro, sendo que mais duas produções estão em andamento: O vocabulário dos dias e Educ@ção: senões e pro-posições.
Não podemos nos esquecer das ações de Gustavo Cabral para encontrar caminhos a fim de, com demais cientistas, acabar com os efeitos destrutivos de um vírus que alterou completamente nosso modus operandi.
Toda essa produção cultural, científica e educacional nos revela um dos trechos disponíveis na letra do hino de nossa cidade: “Tucano, os teus filhos sempre vão te amar”. Como “amar” pode ser um verbo vazio se não houver atitudes, as ações aparecem na valorização daquilo que temos e pode nos ajudar a transformar uma cidade que ainda possui inúmeros problemas estruturais, agravados por uma experiência pandêmica que afetou a todos(as), no mundo inteiro.
Dizem que Tucano se emancipou, mas um espaço/território emancipado não se desenvolve se não promover a emancipação ético-política-educacional-cultural de seu povo, o que é feito por meio de processos formativos preocupados com o ser humano e suas subjetividades, o que pouco está sendo valorizado em tempos obscuros e negacionistas. 21 de março também é momento para pensar se, de fato, essa emancipação “política” se concretizou, ou se ela se perdeu no meio da história marcada por entraves e vicissitudes.
Tenho orgulho de ser tucanense e de poder banhar-me nas águas termais que desta terra brotam. Infelizmente, não poderei estar junto, presencialmente, para comemorar mais uma travessia simbólica, mas fico deveras feliz ao saber que filhos e filhas deste lugar estão fazendo valer a premissa topofílica exarada em um hino que celebra nossos encantos infinitos, ricas tradições e nossa história que se entrecruza com o presente e o passado de nossa nação.
OSVALDO ALVES DE JESUS JÚNIOR é amante das letras e das narrativas. É formado em Letras Vernáculas e Pedagogia, tendo pós-graduação em Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa, Metodologia do Ensino Superior, Psicopedagogia Clínico-Institucional, e Gênero e Sexualidade na Educação. Em 2018, publicou seu primeiro livro de crônicas, Fragmentos sinestésicos. Em 2019, lançou An…danças: facetas cotidianas, obra que contém prefácio da filósofa Marcia Tiburi. Em 2021, publicou BNCC: que axé ela tem? Participa, constantemente, de antologias literárias.